28 novembro 2011

Fado


Fado, Tinta da china e lápis sobre papel, A5, 2008



No teu poema
Existe um verso em branco e sem medida
Um corpo que respira, um céu aberto
Janela debruçada para a vida.

No teu poema
Existe a dor calada lá no fundo
O passo da coragem em casa escura
E aberta, uma varanda para o Mundo.

Existe a noite
O riso e a voz refeita à luz do dia
A festa da Senhora da Agonia
E o cansaço do corpo que adormece em cama fria.

Existe um rio
A sina de quem nasce fraco ou forte
O risco, a raiva, a luta de quem cai ou que resiste
Que vence ou adormece antes da morte.

No teu poema
Existe o grito e o eco da metralha
A dor que sei de cor mas não recito
E os sonos inquietos de quem falha.

No teu poema
Existe um cantochão alentejano
A rua e o pregão de uma varina
E um barco assoprado a todo o pano.

Existe um rio
O canto em vozes juntas, vozes certas
Canção de uma só letra e um só destino a embarcar
O cais da nova nau das descobertas.

No teu poema
Existe a esperança acesa atrás do muro
Existe tudo mais que ainda me escapa
E um verso em branco à espera... do futuro.

...
José Luís Tinoco

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